Medida provisória que não converte em lei mantém a eficácia p/ INSS

A Medida Provisória 739 (“MP do pente fino”) foi revogada, mas o INSS continua aplicando suas normas para alguns segurados.

por Alessandra Strazzi

29 de novembro de 2016

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A medida provisória 739, de 07 de julho de 2016, que ficou conhecida como “MP do pente fino”, expirou dia 04/11/2016, pois foi revogada tacitamente, já que não houve votação pelo Congresso Nacional no prazo constitucional.

Este medida provisória tratava de assuntos previdenciários e foi bastante danosa aos segurados do INSS. Dentre outras coisas, ela modificou a carência exigida para quem volta a contribuir para o sistema.

[Obs.: para entender melhor o assunto, recomendo os artigos de minha autoria “Como fica a carência após a medida provisória 739/2016?” e “O que é carência no Direito Previdenciário?”.]

Entretanto, para o INSS, medida provisória não convertida em lei mantém a sua eficácia. Explico.

É que no dia 09/11/2016 foi editado um memorando interno do INSS (memorando-circular nº 53 /DIRBEN/INSS de 9 de novembro de 2016 – republicado abaixo) que trata exatamente da não conversão da MP 739 em lei e da alteração na regra da carência.

O que me levou a fazer esta afirmação maluca do título foi o seguinte trecho do memorando:

“Para fato gerador ocorrido no período entre 08.07.16 a 04.11.16, serão aplicadas as regras da MP referida.”

[Obs.: o fato gerador pode ser a data do início da incapacidade (DII), parto, guarda, aborto ou adoção, dependendo do benefício pleiteado (auxílio-doença, aposentadoria por invalidez e salário-maternidade).]

Entendeu? Por exemplo, se o segurado ficou incapaz entre os dias 08/07/2016 e 04/11/2016, ele terá necessariamente que obedecer as regras de carência da MP 739.

Mas, antes de continuar nossa discussão, é importante fazermos algumas observações sobre medidas provisórias, de acordo com a nossa Constituição Federal.

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Brevíssimas observações sobre medida provisória e seus efeitos

Resumidamente, medida provisória é uma espécie de norma editada pelo Presidente da República que possui força de lei e começa imediatamente a produzir efeitos tão logo é editada (ou seja, este tipo de normal não é feita pelo Poder Legislativo e não segue o devido processo legislativo).

A eficácia de uma medida provisória é de sessenta dias, prorrogáveis, uma única vez, por igual período (ou seja, 120 dias, no máximo).

Para que a medida provisória mantenha sua eficácia, ela deve ser convertida em lei pelo Congresso Nacional dentro deste prazo de 120 dias. Caso não seja convertida, ocorre a rejeição da medida provisória, que pode ser expressa (o Congresso vota contra a medida) ou tácita (o prazo decorre sem que o Congresso vote sobre a medida).

[Obs.: a medida provisória é apreciada pelo Poder Legislativo segundo os mesmos trâmites do processo legislativo ordinário.]

A medida provisória rejeitada expressa ou tacitamente perde a vigência, desde a sua edição (efeitos retroativos ou ex tunc), nos termos do § 3º do art. 62, da Constituição Federal. Vejamos:

“CF, Art. 62, § 3º As medidas provisórias, ressalvado o disposto nos §§ 11 e 12 perderão eficácia, desde a edição, se não forem convertidas em lei no prazo de sessenta dias, prorrogável, nos termos do § 7º, uma vez por igual período, devendo o Congresso Nacional disciplinar, por decreto legislativo, as relações jurídicas delas decorrentes.”

Entretanto, existe um detalhe muito importante que não podemos deixar passar despercebido. Eu acredito que foi uma interpretação equivocada do § 11 do art. 62 da CF o que levou o INSS a editar o memorando citado acima.

“CF, Art. 62, § 11. Não editado o decreto legislativo a que se refere o § 3º até sessenta dias após a rejeição ou perda de eficácia de medida provisória, as relações jurídicas constituídas e decorrentes de atos praticados durante sua vigência conservar-se-ão por ela regidas.”

Ou seja, nos termos do citado § 11, ainda que não seja convertida em lei, uma medida provisória pode continuar produzindo efeitos para as relações jurídicas decorrentes de atos praticados durante a sua vigência (isso é chamado de ultraeficácia ).

Na minha opinião, este parágrafo é de constitucionalidade duvidosa, mas continuemos nossa discussão.

Ultraeficácia e a medida provisória 739/2016

De acordo com o que acabamos de estudar e caso não haja a edição do mencionado decreto legislativo, o item 4 do memorando do INSS até que faria algum sentido. Vejamos:

“Relativamente aos atos praticados com base na MP nº 739/16, não caberá a adoção de qualquer procedimento até o transcurso do prazo de sessenta dias, observado o disposto nos §§ 3º e 11 do art. 62, da Constituição Federal/88”

Certo… Os casos em que, por exemplo, o segurado ficou incapaz, fez o requerimento de auxílio-doença para o INSS e tomou um não devido à falta de carência, tudo isso dentro do período de vigência da MP, não serão revistos. Até entendo.

Entretanto, o que o INSS pretende é que, independente de ato praticado ou não, todos aqueles que possuam seu fato gerador no período de vigência da MP 739 terão sua carência regida por ela.

Ou seja, caso uma pessoa tenha ficado incapaz dentro do período de vigência da MP, mesmo que ela não tenha (por qualquer motivo) feito o requerimento de auxílio-doença dentro deste período, mas o faça agora, após a rejeição da MP, ainda assim ela deverá seguir a regra de carência da MP 739.

Consegue perceber a diferença? No primeiro exemplo temos um ato jurídico já praticado. No segundo, ainda não.

No meu entendimento, os casos que se encaixam no segundo exemplo deveriam seguir a carência mais benéfica (ou seja, não aplicar a MP 739), pois não houve um ato jurídico praticado e a medida provisória perdeu seus efeitos desde a sua edição (efeitos retroativos).

E digo mais… Caso algum segurado que se encaixe no primeiro exemplo faça um novo pedido de auxílio-doença, entendo que este deverá ser apreciado novamente, desta vez aplicando-se as regras de carência mais benéficas. Os efeitos financeiros seriam relativos à data do segundo requerimento administrativo, no meu entendimento.


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Memorando- Circular nº 53 /DIRBEN/INSS de 9 de novembro de 2016

INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL Memorando- Circular nº 53 /DIRBEN/INSS
Em 9 de novembro de 2016.
Aos Superintendentes-Regionais, Gerentes-Executivos, Gerentes de Agências da Previdência Social, Especialistas em Normas e Gestão de Benefícios, Chefes de Divisão/Serviço de Benefícios, Chefes de Serviço/Seção de Reconhecimento de Direitos e Chefes de Serviço/Seção de Manutenção.
Assunto: Não conversão em lei da Medida Provisória nº 739, de 7 de julho de 2016, republicada em 12 de julho 2016. Alteração na regra da carência.

  1. A Medida Provisória-MP nº 739, de 7 de julho de 2016, republicada em 12 de julho de 2016, alterou a Lei nº 8.213, de 1991, revogando o parágrafo único do art. 24 e incluindo o parágrafo único no art. 27.
  2. Entretanto, a MP nº 739/16 não foi convertida em lei no prazo regulamentar e, dessa forma, as alterações promovidas pela mesma não devem ser aplicadas para fato gerador a partir de 05.11.2016. Para fato gerador ocorrido no período entre 08.07.16 a 04.11.16, serão aplicadas as regras da MP referida.
  3. Na análise dos benefícios, relativamente a regra da carência que foi modificada pela referida MP, devem ser observadas as orientações a seguir: I – análise da carência exigida para os benefícios de auxílio-doença, aposentadoria por invalidez e salário-maternidade, cujo fato gerador (data do início da incapacidade-DII, parto, guarda, aborto ou adoção) tenha ocorrido a partir de 05.11.2016, inclusive, retorna a regra contida no parágrafo único do art.24 da Lei nº 8.213/91, com aplicação de 1/3 da carência: a) se houver perda da qualidade de segurado, as contribuições anteriores à perda serão consideradas para fins de carência, depois que o segurado contar, a partir da nova filiação ao Regime Geral de Previdência Social-RGPS com, no mínimo, 1/3 (um terço) do número de contribuições exigidas para a concessão do respectivo benefício; b) para o auxílio-doença e a aposentadoria por invalidez o segurado deverá possuir, no mínimo, quatro contribuições mensais sem perda da qualidade de segurado que, somadas às anteriores, deverão totalizar doze contribuições; PÚBLICO INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL c) para o salário-maternidade, nos casos em que seja exigida carência mínima, a/o segurada/o deverá possuir, no mínimo, três contribuições, recolhidas após a perda da qualidade de segurado que, somadas às anteriores, deverão totalizar dez contribuições; d) as orientações acima não se aplicam aos benefícios isentos de carência.
  4. Relativamente aos atos praticados com base na MP nº 739/16, não caberá a adoção de qualquer procedimento até o transcurso do prazo de sessenta dias, observado o disposto nos §§ 3º e 11 do art. 62, da Constituição Federal/88.
  5. Até a adequação dos sistemas, os benefícios das espécies 31, 32 e 80 com fato gerador (DII, parto, guarda, aborto ou adoção) a partir de 05.11.2016, que não possuam a carência mínima (10 ou 12 contribuições, conforme o caso), serão sobrestados automaticamente pelo sistema, com a crítica 2: “1057- Aguarda adequação Norma/sistema”.

Atenciosamente,
TIAGO THALES CORREA MACIEL
Diretor de Benefícios Substituto

FONTES:
MP do pente-fino do INSS expira na sexta
MP que determinou ‘pente-fino’ no INSS perde validade nesta sexta
Medida Provisória 739/2016

Alessandra Strazzi

Alessandra Strazzi

Advogada por profissão, Previdenciarista por vocação e Blogueira por paixão.

OAB/SP 321.795

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